segunda-feira, 29 de setembro de 2008


A Partida - 1987

Este quadro reporta-nos para uma certa intimidade entre as duas personagens do quadro. É uma cena de exterior onde representa a praia da Ericeira onde Paula Rego passava férias com frequência. Este quadro é composto por duas personagens, a figura feminina encontra-se de pé por trás da figura masculina que esta sentado num banco. A figura feminina está modestamente vestida o que conjuga com o avental branco que lhe atribui um papel de criada, no entanto o cabelo está preso com duas tranças o que lhe confere um ar jovial. O homem contrasta com a figura feminina no vestuário, visto que este se apresenta ricamente vestido.
A figura feminina cuida delicadamente do seu cabelo enquanto o homem se delicia com estes cuidados demonstrando serenidade e satisfação através da sua expressão facial. Os elementos pictóricos mais próximos do observador confirmam a ideia transmitida pelo titulo – A Partida. Desta forma, podemos ver uma mala com sobretudo pousado em cima indicando que a figura masculina está de partida.
Considerando que este quadro foi pintado num de grande sofrimento da artista devido ao agravamento considerável da doença de Vic. Nesta obra Paula Rego evoca a despedida eminente do seu companheiro de vida. As malas prontas e o casaco sobreposto sobre a mesma indicam-nos a noção que a artista tinha sobre a proximidade inequívoca da morte do seu amor e a quem dedicou tanto da sua vida mas ao mesmo tempo a quem devia tanto da sua carreira.
Torna-se um quadro altamente emotivo devido à temática e sobretudo à serenidade de um olhar que sabe que o fim está para breve.


Tríptico (aborto) - 1998

Este é o primeiro de dois trípticos pintados pela artista sobre o aborto. Sendo este um tema que conduz a mulher à discriminação em Portugal, Paula Rego produziu várias obras onde aborda a temática de forma a provocar o observador tornando-o cúmplice do sofrimento e da discriminação de quem, por factores económicos, tem de recorrer ao aborto clandestino.
Desde sempre a mulher tem sido discriminada pelo sexo, pela falta de poder, pela baixa escolaridade, por ser considerada o “sexo fraco” mas nesta obra apresenta a falta de direitos à escolha do seu futuro.
As questões relacionadas com o aborto, embora choquem e provoquem discussão, são situações pelas quais as mulheres em Portugal eram punidas e consideradas criminosas socialmente. Paula Rego aborda esta temática como forma de alerta para o sofrimento da mulher.
No quadro da esquerda, no centro, vemos uma mulher sentada numa cama, de pernas afastadas, tendo uma toalha por baixo de si e uma tigela do seu lado direito, por baixo da qual podemos ver um balde e um alguidar. Embora o rosto da mulher pareça tranquilo, vê-se que parece olhar o infinito, despido de sentimentos e emoções, a pressão que as mãos exercem nas pernas deixa transparecer o sofrimento interior desta mulher. Todos os restantes elementos do cenário são significativos para indicar ao observador que esta mulher sofreu um aborto.
Na imagem central, temos como elemento central uma mulher ajoelhada, por baixo de si podemos ver um recipiente, está com a cabeça apoiada na cama que está coberta por um manto vermelho e por uma toalha branca atravessada. No fundo da cama pode-se ver um recipiente para a água e um cadeirão tombado. Se no quadro anterior o sofrimento só seria perceptível pela força das mãos nas coxas, neste quadro o sofrimento da mulher é bem visível, a cama desarrumada, o cadeirão caído, a sua cabeça apoiada na cama e sobretudo a sua expressão denunciam-nos um sofrimento atroz. Estando com roupa interior, leva-nos a deduzir que este processo já teve início há algum tempo e devido à dor. Deduz-se que esta mulher já tentou aliviar o sofrimento tirando a roupa, já deveria ter tentado várias posições e que já se espalhou por todo o quarto.
Na imagem da direita temos representado em grande plano uma mulher que, aparentemente, dorme tranquilamente, tem uma mão que segura a almofada e os sofás revelam já alguma decadência. Neste quadro esta mulher parece jovem, devido ao penteado e ao vestuário ( os ténis) o que nos leva a deduzir que esta jovem já passou por algum tipo de sofrimento, tem o rosto bastante fechado para quem dorme e a posição das pernas também será indício do sofrimento passado.
Este quadro por si só não teria o mesmo significado que tem quando o englobamos no tríptico sobre o aborto. Assim, se no primeiro quadro vemos uma mulher que ainda não revela grande sofrimento, temos um segundo quadro onde isso é representado sem qualquer dúvida e de seguida temos este terceiro quadro que nos apresenta uma mulher a dormir. Analisando esta sequencia podemos deduzir que a primeira imagem poderá representar alguém que se encontra numa primeira fase, em que as dores ainda se suportam e em que é fundamental manter a calma e a posição de expulsão.
Na segunda imagem, aquela mulher já não suporta as dores e a tortura é de tal forma que tudo servirá para aliviar o sofrimento, esta última é a imagem de alguém que adormece de exaustão que depois de todo o sofrimento físico e psicológico já não resiste e adormece. Este tríptico foi elaborado aquando do referendo sobre o aborto, pretendo alertar para o sofrimento da mulher que aborta não por prazer mas por necessidade.

À Janela - 1987


Este quadro pertence ao grupo de obras do Crime do padre Amaro inspirado na obra literária de Eça de Queiroz com o mesmo nome. Contrariamente ao romance, Amélia permanece na história e é ela a personagem principal. Em “À Janela” vemos uma personagem em grande plano que se encontra de costas para o observador, o seu pé esquerdo encontra-se em cima de um cadeirão de vime e devido a essa posição a saia deixa ver parte da perna. A figura encontra-se debruçada numa janela de onde irradia luminosidade, tendo um dos braços apoiado no parapeito da janela o outro serve de suporte ou apoio à cabeça.
Neste quadro é representada a mulher que espera à janela que alguém decida a sua vida, incapaz de determinar o rumo da sua vida olha pela janela aberta à espera de liberdade. Sendo ela a personagem principal, esta Amélia de Paula Rego não demonstra capacidade de luta neste quadro (embora esteja subjacente em vários outros), ao ser ludibriada por um amor explorado e excomungado, ela espera calmamente que a luz do dia ilumine a sua vida.

A Casa de Celestina - 2000/2001

Neste quadro, Paula Rego representa toda a mentalidade que envolve a virgindade da mulher. Começando por fazer uma análise descritiva do quadro vemos no centro, numa cena bem iluminada uma mesa, à volta da qual encontramos as personagens. Do lado esquerdo da mesa vemos uma figura feminina que aparenta alguma idade, devido à luminosidade e postura desta figura vemos que será a matriarca e a personagem principal à volta da qual a cena gira, tem os seios descobertos e uma túnica transparente cobre-lhe parte do corpo. Ao seu lado vemos um casal, também com alguma idade que estão a ser servidos por um empregado que se encontra na penumbra, a senhora tem a mão sobre o peito do homem demonstrando posse e domínio.
Do lado esquerdo da personagem principal vemos duas figuras masculinas deitadas no chão e a dormir ou embriagados, acabando por ridicularizar a situação das figuras masculinas.
No topo da mesa, em primeiro plano, vemos uma figura feminina de braços cruzados e perna esticada. Nas costas da personagem principal vemos um escadote onde está pendurada uma sacola e em cima do escadote encontram-se alguns livros, sobre os quais está sentado um rapaz que olha na direcção do muro sobre o qual se encontram duas figuras femininas. A mais velha e com avental vigia a mais nova não permitindo qualquer aproximação física entre o casal de jovens.
No extremo esquerdo do quadro vemos uma porta, com o interior bem iluminado e onde podemos ver um homem sentado num banco que observava a mulher nua à sua frente, esta mulher inclina a cabeça para o “interior” da divisão. Esta situação representa a “escolha” e “compra” de mulheres para satisfazer os prazeres sexuais. A mulher desfila de forma a ser aprovada e escolhida pelo cliente.
Num primeiro plano, do lado direito, vemos uma figura sentada no chão com os braços esticados embora seja uma posição associada a crianças, podemos ver que o rosto e as mãos pertencem a uma pessoa idosa. A posição assumida pela personagem indica-nos desespero, um pedido de ajuda urgente. À sua frente vemos duas mulheres que trabalham na costura e que parecem conversar, estas figuras representam a crítica social, representam as coscuvilheiras que passam o tempo a dizer mal de tudo e de todos. Num plano ligeiramente afastado podemos ver três figuras femininas: uma criança, uma mulher e uma velha. A mulher usa um vestido provocante e encontra-se numa postura irreverente, representa as mulheres que entraram na exploração sexual devido à perda da virgindade e que por isso eram automaticamente “excluídas” da sociedade. A senhora mais velha tem a criança no colo, o olhar desta senhora revela grande concentração enquanto o olhar da criança dirige-se para o infinito, é um olhar vago. A mulher mais velha representa as matriarcas que coziam as meninas como forma de assegurar a continuidade da virgindade até ao casamento.
No canto superior direito vemos uma figura feminina que está em queda, a mão segura o cabelo e a outra “defende-se da queda”. Esta personagem representa as mulheres que por vários motivos perdiam a virgindade e eram banidas, atiradas fora da sociedade.
Todo o quadro anda à volta da temática da virgindade feminina. Estão representadas as várias formas de prevenção bem como as consequências da mesma.

A filha do polícia 1987

A imagem representa uma cena interior iluminada por uma grande abertura na parede. Ao centro vemos uma figura feminina de cabelos longos que se encontram presos para não prejudicar a sua tarefa, tem um longo vestido branco, usando ainda meias e sapatos igualmente brancos, sendo este símbolo de pureza e inocência.
Encontra-se sentada numa cadeira requintada com uma das pernas dobrada e sobre a qual está ligeiramente sentada demonstrando uma postura descontraída e irreverente, o que nos indica que se trata de uma jovem que apesar da posição deselegante revela, ao mesmo tempo, estar atenta e obediente a limpar uma bota de cano alto. A sua expressão revela alguma insatisfação, o olhar baixo indica subordinação e conformismo. Em primeiro plano vemos um gato que, como se encontra na penumbra, quase se confunde com a sobra projectada pela parede. Este gato encontra-se ligeiramente erguido apoiando-se na parede. A temática do homem como ser inútil volta a ser retratado, até para limpar a bota serve-se do trabalho feminino, que é explorado e sacrificado a exercer funções que caberiam ao homem. O título da obra, a postura da figura, bem como a sua roupa leva-nos a deduzir que não se tratará da esposa do polícia mas antes da filha.
Implicitamente temos o homem visto como um inútil nas tarefas domésticas que até para limpar as próprias botas se serve do trabalho feminino, que é explorado e sacrificado a executar tarefas que caberiam ao homem. O gato terá aqui um poder simbólico significativo, sendo um animal conhecido pela sua agilidade e curiosidade poderá estar aqui representando os atributos da personagem, a silhueta do gato na penumbra representa a submissão ao domínio masculino mas que espera o momento certo para saltar e explorar o mundo lá fora.

A Madrinha do Novilheiro - 1990

Esta obra representa uma cena interior, um quarto onde vemos uma cama, uma cadeira do lado esquerdo, uma mesinha, do lado direito, e um candeeiro que ilumina a cena. Em primeiro plano, vemos uma figura feminina sentada num sofá, coberta por um pano vermelho que simboliza o pecado mas que ao mesmo tempo contrasta com a cor da roupa da figura que sendo branca representa a pureza. Apesar da figura estar de lado para o candeeiro, tem o rosto bastante iluminado, bem como o pano que lhe cobre as pernas.
Em segundo plano vemos duas figuras de pé, um homem que pelo traje estará ligado ao toureio e uma mulher que o observa e lhe toca no peito, esta segunda mulher revela ser mais velha.
Paula rego refere que muitas vezes assistiu a situações de casamentos arranjados em que eram as “madrinhas” que tratavam dos mesmos de forma a conjugar riquezas ou como troca de favores. Pelo aspecto mais velho, sábio e pela postura vê-se que a mulher que se encontra de pé prepara o noivo para consumar o acto de forma a oficializar o casamento visto que o manto vermelho nas pernas da menina indiciam que ela espera calmamente pelo homem que recebe os últimos conselhos da mulher mais velha, por sua vez, mulher é mais uma vez usada como objecto sexual, muitas vezes sem vontade própria.

A Capoeira - 1998

O mundo interno e secreto da mulher é muitas vezes retratado. Neste quadro esse ambiente é ricamente representado numa espécie de homenagem à gravidez e que sendo uma das fases da vida exclusivamente femininas, Paula Rego recria emoções, sentimentos e receios evidenciados nesta etapa aproveitando para igualmente retratar os pensamentos e medos que pairavam na cabeça de Amélia de “O Crime do Padre Amaro” e que contrariamente à obra de Eça de Queiroz, ela aqui é protagonista.
Neste quadro vemos quatro personagens femininas, três das quais têm as mesmas características faciais enquanto a restante é, pela expressão facial, mais velha. Estas três figuras representam a Amélia em três momentos diferentes da gravidez, no centro do quadro e em grande plano vemos duas dessas personagens: a primeira encontra-se sentada e ligeiramente inclinada para a frente o que nos indica, devido a esta posição, que a gravidez ainda está no princípio o que é reafirmado pelo ar sonhador e calmo da personagem. Parece que sonha com o Amaro que a virá salvar daquela “jaula” e com o filho que será o seu libertador; a segunda figura encontra-se também sentada mas agora num cadeirão mais confortável com apoio para os braços e sobre a qual está recostada deixando bem visível a barriga saliente de uma gravidez já avançada, isto conjugado com o facto de ter uma boneca no colo excessivamente pequena indicam que o nascimento do bebé está próximo. O seu rosto já apresenta sinais de preocupação, como também simboliza o receio natural de todas as futuras mães.
Num plano mais afastado vemos Amélia já de cabelo solto a ser ajudada a levantar-se da cama depois do parto por uma mulher mais velha(possivelmente parteira). A grande referencia à obra está no significado dos restantes elementos que compõem o quadro e sabendo que na obra literária original Amaro mata o seu próprio filho e Amélia acaba por morrer também, podemos ver no chão do quarto, num plano próximo do observador, um livro vermelho que nos liga ao texto narrativo de Eça, à sua frente podemos ver um pombo moribundo e sabendo que este animal é usado como correio para o transporte de noticias, entende-se que a noticia esperada ou já comunicada não é boa, será antes o pronuncio de morte. Esta informação é confirmada pela conjugação com a galinha morta que se encontra pendurada no canto superior esquerdo simbolizando a morte do bebé e da própria Amélia como no texto original.

domingo, 28 de setembro de 2008


"A Família" (1988)
Esta poderá ser uma das grandes obras de Paula Rego onde se evoca a igualdade de géneros, a forma como ela representa o homem pasivo que contrapõe com as acção feminina. Por outro lado, há icones que nos indiciam a presença de violencia doméstica como veremos mais pormenorizadamente.
Neste quadro podemos ver no primeiro plano, do lado esquerdo, uma mesa parcialmente coberta por um pano vermelho, onde também constam um jarro e uma flor vermelha em que parte pende para fora da mesa. No segundo plano, centrado, vemos três figuras, duas femininas e uma masculina, esta encontra-se sentado nos pés da cama e as duas mulheres cuidam dele. Num terceiro plano, podemos ver uma quarta figura que observa a cena, é uma figura bastante iluminada encontrando-se junto da janela que está aberta, no plano mais afastado vemos um armário com um oratório.
Paula Rego representa com frequência a figura masculina como inútil, também neste quadro, a figura masculina que deve representar o pai, está sentado, com as pernas afastadas, passivo, deixando que as mulheres tratem dele. A figura que está à sua frente, no meio das pernas da figura masculina, representa a mãe, pelo seu aspecto mais velho e fechado, segura as calças do pai. A figura que se encontra por trás do pai, será a filha mais velha, embora tenha um laço no cabelo, nota-se que não é tão velha como a menina que se encontra junto da janela. A filha está de joelhos em cima da cama permitindo-lhe segurar a mão e ajudar o pai com a manga, a menina junto da janela dirige o olhar para o observador, evitando olhar para a acção.
O oratório do fundo do quarto conduz-nos ao mundo da violencia domestica. Nesse oratório vê-se uma imagem feminina que eleva o olhar para o céu em prece e aos seus pés vemos uma figura masculina e jovem que luta contra um forma animalesca. Esta ultima figura ao manter um ramo de árvore levantada indicando que irá bater na figura que se encontra por baixo é uma mensagem de violência e provoca o observador que se sente provocado mas tambem ele passivo.

A Guerra - 2003
As fontes de inspiração são as mais variadas, as notícias reais que nos assolam todos os dias também poderão ser uma fonte rica de inspiração, nesta fase com o despoletar da guerra do Iraque, Paula Rego vê nessas noticias um tema de exortação dos nossos medos. Já havia retratado a guerra colonial, já se tinha manifestado sobre questões políticas e sociais, agora a guerra travada entre o ditador militar Saddam Hussein e o seu povo e entre ele e George Bush formam um conjunto de medos, ideias e revoltas envoltos numa nuvem de secretismo e mistérios, ainda são referenciados relatos de violações, abusos sexuais e de poder, humilhações e torturas por parte das tropas americanas.
Neste quadro vemos, tal como o título indica, os horrores da guerra. No centro do quadro e em grande plano vemos duas figuras femininas com cabeças gigantescas de coelhos, a figura que está ao colo, tem o rosto ensanguentado fazendo-nos lembras as imagens da guerra onde mães fogem com as filhas feridas ao colo. Em baixo mas em primeiro plano vemos uma cegonha que segundo Rosengarten (2004) tem o cordão umbilical ligado a uma coelha que pelo vestuário vemos ser jovem e cuja expressão de sofrimento ergue os olhos para o céu, este conjunto de elementos poderá indicar uma gravidez não desejada numa jovem e em tempo de guerra; por sua vez Sandra Santos (2005) diz que a cegonha tem a sua pata por baixo da saia da menina que com expressão de sofrimento nos indica violação e da qual surge uma gravidez (representado pela cegonha). Em frente a estas figuras vemos uma outra vestida de vermelho, com laços nas orelhas e com ar zangado e que esconde algo nas mãos e de frente vemos uma senhora com um pau que faz lembrar a heroína portuguesa, a padeirinha de Aljubarrota que olha para esta coelha e que embora seja bastante maior não demonstra qualquer receio avançando sobre ela de braço firme no pau.
No canto superior esquerdo vemos um insecto gigante que aparentemente acaricia o cão de aspecto velho, no entanto a pata levantada pode indiciar alguma agressividade. Por trás destas figuras vemos uma personagem de olhos fechados que carrega ao ombro uma ave morta representando os que fogem do campo de batalha transportando consigo os entes queridos mesmo quando estão mortos Sandra Santos (2005). No canto superior direito temos um gato que parece de loiça, onde estão representados aqueles que num período de guerra fecham os olhos e fingem ser de barro, mas ainda segundo a mesma autora, o barro também se quebra.

sábado, 27 de setembro de 2008


"O Jardim do Interrogador" (2000)

Este quadro remete-nos para uma interpretação social e militar. No centro do quadro, bem iluminada está uma figura que embora esteja vestida com trajes masculinos tem expressão feminina, vemos ainda do lado direito uma ovelha que tem o cinto atado ao pescoço, bem como a perna do animal que se encontra preso por um cordel que termina num novelo. Num segundo plano do lado direito vemos uma figura feminina que olha para o chão, este quadro ridiculariza o homem, sobretudo aquele que aparentemente detêm o poder como é o caso dos militares. Paula Rego viveu um longo período da sua vida sob a ditadura de Oliveira Salazar onde se viviam grandes pressões sociais e militares e onde testemunhou as mais diversas pressões por parte dos mesmos.
Esta atmosfera foi transposta para o ano deste quadro quando despoletou a Guerra do Iraque, foram vários os relatos chegados pelos meios de comunicação social em que se dava conta das atrocidades que os militares exerceram sobre o povo Iraquiano e onde muitas vezes as mulheres tiveram que se submeter aos caprichos sexuais dos militares como forma de pouparem os familiares de torturas. Esta imagem é representativa das situações acima referidas, em qualquer uma delas, o homem exerce poder sobre a mulher submetendo-a aos seus desejos sexuais e tal como foi referido, a figura central embora tenha elementos de trajes masculinos ligados à polícia, vemo-la com luvas vermelhas que se relacionam com o sexo, bem como a ausência das calças e a figura feminina que parece ainda se estar a vestir.
A ovelha presa pelo cinto indicará o poder que a figura principal exercerá sobre o indefeso animal, o cordel que termina num novelo poderá indicar os meandros e labirintos em que se envolve o poder policial, poder exercido sobre os mais frágeis que se encontram à sua mercê, a figura feminina que parece compor-se está semi – despida na parte superior do corpo e o desvio do olhar indicará vergonha. Mais uma vez, olhando para a figura que se supõe representar um homem, verificamos feições femininas, tentando desta forma ridicularizar esta figura de poder aparente, e representando assim o poder da feminilidade.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Paula Rego - A mulher dos bolos


"A Mulher dos Bolos" (2004)

Embora cada vez mais a sociedade se depare com a chamada epidemia dos novos tempos, a obesidade é preocupante, no entanto a obsessão pelo ideal de magreza é um culto em expansão, de tal forma que, segundo os dados recolhidos e publicados pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada, 35% das raparigas estudantes com idades compreendidas entre os 12 e os 16 anos revelaram essa preocupação com o aspecto físico entre as quais foram detectados 8% de casos de bulimia e anorexia. Outra das grandes epidemias da sociedade conduz-nos ao abuso sexual de menores e à pedofilia que, embora já tenha sido um assunto trabalhado anteriormente pela artista, está ainda aqui bem presente.
Este quadro apresenta-nos os vértices deste triângulo social: obesidade/ anorexia/pedofilia, evoca ainda outro tipo de descriminação: a mulher que não corresponde aos estereótipos da beleza da mulher moderna.
A cena representada passa-se no exterior, no fundo vemos o mar e o chão é areia, podemos ver no centro da imagem, uma figura feminina, vestida de branco que tem nas mãos um tabuleiro com bolos, do lado esquerdo temos uma outra figura feminina deitada no chão, elegante e com os braços cruzados sobre o estômago, tem os olhos revirados e uma expressão fria. Por cima dela surge-nos uma figura monstruosa com mãos e pernas bastante finas e com cabeça de caveira, parece olhar para o observador, do lado direito, vemos duas figuras masculinas, um velho que é beijado por um jovem. Quanto à interpretação simbólica, vemos que a mulher do centro do quadro tem um olhar calmo e quase sorri enquanto segura num tabuleiro com bolos em forma de monstros, esta senhora vestida de branco não representa o ideal de beleza físico “imposto” pela sociedade, notando-se que apesar de gordinha deixa transparecer calma, tranquilidade e até satisfação. Em contrapartida, vemos a figura deitada no chão que, apesar de esbelta o seu rosto revela sofrimento, as mãos apertando o estômago, os olhos revirados e o monstro que passa por cima dela são sinal da dor desta figura.
Por trás desta cena surgem duas figuras masculinas, a figura mais velha, com os olhos semicerrados e olhando de canto para a mais nova observa a acção do mais novo que, de mãos nos bolsos o beija com alguma frieza. Neste quadro, Paula Rego faz três críticas sociais: A mulher de branco, que representa a mulher não estereotipada, no entanto com ar tranquilo, a mulher deitada, de uma beleza fora de vulgar para manter a sua magreza sofre vendo os bolos que se transformam em monstros e o monstro que paira por cima dela é sinal da anorexia e as duas figuras masculinas representam a pedofilia.

sábado, 20 de setembro de 2008

Paula Rego


Paula Rego, "Anjo" - 1998

Este é uma das grandes obras de Paula Rego que se tornou um icone da Igualdade de Géneros. Tal como podemos ver, está representada uma mulher guerreira que é ao mesmo tempo uma dona de casa.

Representa quase um hino à mulher moderna. Este quadro evoca a força, garra, capacidade de luta mas ao mesmo tempo podemos ver um olhar sereno, um quase sorriso e uma dedicação á casa e consequentemente à família.
Este quadro é composto por apenas uma personagem: uma mulher de pé com a cabeça delicadamente inclinada e os braços ligeiramente abertos. Numa das mãos podemos ver uma espada enquanto na outra vemos uma esponja de limpeza, o vestuário remete-nos para o século XIX com saia comprida, entufada e a blusa de cetim preto. Parece-nos um misto de anjo da guarda e anjo vingador que enfrenta as dificuldades sozinha, que, embora seja vitima de preconceitos e desigualdades enfrenta a sociedade lutando contra esses valores e defendendo o seu mundo, a sua cria e a sua vida. Representa “a capacidade das mulheres enfrentarem as consequências muitas vezes não desejadas da sua própria sexualidade” [1]
Sendo este um quadro a pastel pintado em tons escuros, podemos ver uma saia ampla em tons dourados representando a glória, o ouro e o brilho natural da mulher, a blusa preta pode representar a repressão, submissão e acanhamento social, no entanto este contrasta com o dourado da saia que poderá representar a vitória, a alegria de ultrapassar os obstáculos, a capacidade de contornar a descriminação e a submissão, representa o contraste emotivo e sentimental. A mão que segura a espada está apertada representando a firmeza e coragem da sua luta, a mão que segura a esponja está mais folgada deixando antever alguma delicadeza que é confirmada com o olhar sereno e simpático.
A blusa embora negra, nota-se o toque acetinado nada comum em roupas de guerreira ou de dona de casa, contudo estas a do vestuário deste “Anjo” representam a capacidade da mulher em saber estar em qualquer ambiente, a capacidade de ser dona de casa, senhora de sociedade, lutadora, guerreira, esposa esmerada e mãe carinhosa.
[1] (BRADLEY, 2002) p: 89

Pelas minhas mãos...

Eu...